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Depressão pós-parto: um bailado desencontrado entre a mãe e o bebé

Texto da autoria de Alexandra Pinto*


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As relações humanas são, em boa parte, como um bailado: há que acertar os passos, os movimentos, os ritmos, a sinfonia…e se há bailado que queremos que resulte é o da mãe e do seu bebé. E quando não é assim? Quando este bailado mãe-bebé está descompassado? Quando à alegria do início de uma nova vida se sobrepõe a tristeza, o desespero e até a rejeição do novo ser? Falamos de Depressão Pós-Parto e mais importante do que fingir que não existe ou que “só acontece aos outros” é conhecê-la, compreendê-la e tratá-la com ajuda especializada.


Comecemos pelo início …

Quando falamos de depressão associada à gravidez, é importante distinguir que o quadro depressivo pode já ser pré-existente na mulher e/ou desenvolver-se ao longo da gravidez, a chamada “depressão antenatal”; ou surgir após o parto, ou seja, a “depressão pós-parto”. Embora ambas sejam merecedoras de atenção e cuidado, focar-nos-emos na depressão pós-parto (DPP).


A DPP pode assumir, essencialmente, dois tipos:

- post-partum blues, mais conhecido como baby blues;

- depressão pós-parto enquanto estados depressivos de longa duração.


Baby blues

Os baby blues caracterizam-se por manifestações depressivas ligeiras e um estado emocional transitório agudo, sem sentido patológico, que surgem entre o 3.º e o 10.º dia após o parto e cuja duração é de algumas horas ou alguns dias. Estima-se que afete cerca de 30% a 80% das parturientes, não necessitando de tratamento específico, mas sim de alguma atenção mais próxima da família e da equipa de saúde.


Principais sintomas: labilidade do humor (alternando entre riso e choro), humor depressivo (cansaço e apatia), momentos de euforia (e.g., surtos de riso sem motivo aparente, conversa sem lógica), choros (e.g., choro intenso por situações irrelevantes, sustos quanto ao bebé), irritabilidade, insónia, sensação de estranheza/despersonalização (que pode levar a um certo afastamento do bebé), confusão (memória de trabalho afetada), perturbações do sono.


Depressão pós-parto

Por seu turno, a DPP enquadra-se no quadro das doenças mentais do puerpério e é possível ser diagnosticada se os sintomas dos baby blues permanecerem e se intensificarem após o 10.º dia de vida do bebé. Os estudos que têm sido feitos neste tema não são totalmente conclusivos, mas estima-se que a DPP afete cerca de 10% a 20% das recém-mães.


Principais sintomas:

- falta de prazer em tomar conta do bebé, sentindo-se incapaz/impotente;

- fobias de impulsão: medo de ter vontade de fazer mal à criança;

- irritabilidade para com quem a rodeia;

- lentidão psicomotora;

- sofrimento;

- cansaço, fadiga muito frequentes;

- perturbações do sono;

- queixas somáticas (corporais) e capacidade de concentração comprometida;

- concomitância com outros sintomas do quadro depressivo;

- labilidade emocional;

- intensificação dos sintomas ao início da noite.


Todas as mulheres terão baby blues ou DPP?

Não há resposta definitiva, mas existem alguns fatores de risco associados ao aparecimento de um ou de ambos os quadros, nomeadamente:

- primiparidade (1.º parto);

- parto por cesariana;

- antecedentes de aborto com sentimento de culpa;

- pouco investimento na preparação para o parto e na planificação do parto;

- depressão antenatal e/ou antecedentes familiares de depressão;

- situação de emprego precária ou desemprego devido à licença de maternidade;

- falta de apoio familiar e social (isolamento);

-características do bebé: irritável, de fraco peso, de difícil consolo, presença de alguma deficiência/condição clínica;

- baixa auto-estima.


Assim sendo...

Inevitavelmente, a DPP traz consigo consequências, quer para a mãe, quer para o desenvolvimento do bebé, e também para a interação entre ambos …

Uma mãe com DPP deverá ter o acompanhamento médico adequado, com psicoterapia e tratamento farmacológico (antidepressivo e ansiolítico), que implica deixar de amamentar. Estará, naturalmente, menos disponível para aceder e responder corretamente às necessidades do seu bebé, dando lugar ao desencontro entre a mãe e o bebé, um bailado descompassado que, a médio e longo prazo, poderá levar a:

- irritabilidade para com a criança e menor tolerância face ao choro, originando maus-tratos;

- comportamentos de evitamento da mãe e do bebé (depressão do bebé);

- angústia de separação;

- baixa auto-estima;

- perturbações cognitivas, emocionais e do desenvolvimento do bebé.


Prevenção: a palavra de ordem

Mas, neste bailado desencontrado, há boas notícias: é possível prevenir e/ou atuar num momento inicial assim que se diagnostica a DPP. A palavra-chave é: PREVENÇÃO! É crucial que a grávida, e futura mãe, seja acompanhada por uma equipa especializada e multidisciplinar que possa, logo à partida, avaliar os fatores de risco e apostar nos fatores protetores para que as interações mãe-bebé sejam o mais harmoniosas e saudáveis possível.

A existência de uma boa rede de suporte, com destaque para o pai do bebé/companheiro e para a família mais próxima, a presença de crenças espirituais e a prática de atividades promotoras de bem-estar (nomeadamente Yoga, Pilates, massagens) são apontadas por vários estudos como algumas das estratégias aliadas à resolução da DPP.

Adicionalmente, a mulher, no meio da montanha-russa hormonal que se vive especialmente na gravidez e no pós-parto, deverá procurar ajuda especializada, para não protelar algo que, futuramente, poderá ter proporções maiores.

*Psicóloga Clínica de formação pelo ISPA-IU). Exerce a sua atividade profissional em contexto de consultório privado, com crianças, adolescentes, adultos e famílias.

Para mais informações: palavradepsicologa@gmail.com

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