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Ser mãe: o emprego a tempo inteiro não remunerado mais gratificante do mundo

Uma mãe nasceu no final de tarde de 1 de outubro, dia Mundial da Música. Volvidos quatro dias, após o nascimento do meu rebento, consegui encontrar a melhor definição possível para o meu papel de mãe: é o emprego a tempo inteiro, não remunerado, mais gratificante do mundo. Apesar de todos os desconfortos da gravidez, da dor do parto e no pós-parto, no final, tudo compensa só pela sensação única e inexplicável de termos o nosso bebé ao colo. É uma alegria sem fim que nos preenche cada poro do nosso corpo e um amor gigante que, todos os dias, cresce ainda mais e que, por ser tão grande, parece que vai rebentar o nosso coração.



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No início da semana, após 40 semanas e dois dias de gestação (e numa fase em que os desconfortos da gravidez eram mais que muitos), desloquei-me às urgências para marcar a indução, inicialmente prevista para dia 4 ou 5 de outubro. Porém, a médica, depois de avaliar concluiu que, devido à falta de líquido amniótico, o ideal seria antecipar a indução para dia 30 de setembro. Depois de sair das urgências, voltei novamente ao hospital, a meio da tarde para ser internada e iniciar a indução do parto.


As primeiras horas são brandas, as dores toleráveis, mas, à medida que as horas passam, cada minuto parece durar uma eternidade e as dores intensificam-se de tal forma que nos fazem contorcer o corpo. É uma dor aguda e localizada, mas é uma dor que por ser tão intensa talvez seja imediatamente esquecida após o parto. Acho que o cérebro encontra mecanismos de nos salvaguardar da experiência dolorosa do trabalho de parto e desliga-se em momentos de maior dor, para que o ser humano continue a dar continuidade à espécie.


No Hospital Beatriz Ângelo, em Loures, onde fui admitada no internamento, as várias equipas, que se foram revesando ao longo das 25 horas em que aguardei pelo nascimento do meu filho, foram incansáveis. Ofereceram logo a epidural, todos os profissionais pediam sempre licença para entrar na sala de partos, onde eu e o meu acompanhante (e companheiro) estivemos o tempo todo. É uma sala individual, com casa de banho privativa, bola de Pilates, aromaterapia, cromoterapia e com espaço para que cada mulher tenha a possibilidade de manter a sua intimidade durante o trabalho de parto.


Bendita epidural

Assim que as dores começaram a intensificar-se, e depois de a enfermeira me ter questionado se pretendia epidural, nem pensei duas vezes. A epidural, como tive oportunidade de dizer ao meu companheiro e a algumas colegas do curso de preparação para o parto, é, de facto, uma das melhores invenções de sempre. A verdade é que esta epidural não me tirou a liberdade de movimentos e, sempre que tive oportunidade, ou ia para a bola de Pilates, que posicionava junto à cama, por estar ligada continuamente ao CTG, ou tentava andar à volta da cama. O objetivo era conseguir aumentar a dilatação e, portanto, todos os esforços que faziam dirigiam-se nesse sentido. Entretanto, lembrei-me de ver um vídeo de um médico que dançava o Despacito com as mulheres grávidas em trabalho de parto. Decidi fazer igual, após 12 longas horas, em que a dilatação parecia ter estagnado. Queria fazer tudo o que estivesse ao meu alcance para que a dilatação evoluísse. E, inspirada no tal médico que dançava Despacito, decidi imitar a experiência e dançar com o meu companheiro, que colocou a música em loop.


Na noite de dia 30 para dia 1 de outubro, com a ajuda da epidural, que me aliviava bastante as dores, consegui descansar, pouco, mas sempre foi alguma coisa... no dia 1 as dores começaram a ser mais intensas. Confesso que a dada altura - porque o nosso cérebro tem o tal mecanismo de defesa e desliga-se - as epidurais já não surtiam o efeito que deveriam ter e, como tal, a anestesista ia reforçando as doses para que a dor fosse tolerável. Recordo-me de doer a nádega esquerda, uma dor tão intensa que não respondia à epidural (devido à posição do bebé) mas que aliviava sempre que o meu mais-que-tudo me massajava. O dia 1 de outubro foi o dia mais longo do ano, para mim... cada hora parecia não ter fim. A boa notícia é que de manhã a bolsa rompeu espontaneamente após um dos toques do médico. Ah, essa foi outra das coisas que gostei no HBA: fosse médico ou enfermeiro, cada profissional perguntava sempre se podia fazer o toque. E faziam o ponto de situação.

Ao início da tarde, após novo toque, já havia evolução da diltação, ao ponto de uma enfermeira me garantir o seguinte: "Não se preocupe porque nasce hoje".


Novo Despacito, novos movimentos e epidural à mistura contribuíram para que a meio da tarde a diltação já estivesse completa. Confesso que ao longo de todas estas horas me passou imensa coisa pela cabeça, nomeadamente a possibilidade de ir para um privado (sim, soa a algo parvo, visto estar na reta final do trabalho de parto) para realizar uma cesariana. Poucos minutos passavam das 16h quando começaram a montar o "teatro de operações". As enfermeiras-parteiras foram incansáveis e explicaram o que ia sentir e como e onde fazer força, para ajudar o bebé a nascer. Bebé que se portou sempre à altura, com um batimento cardíaco sempre constante (exceto uma única vez em que houve uma ligeira quebra, mas nada de relevante) e que depois de encaixar esperava que eu o ajudasse a sair.


Hora pequenina ou nem por isso!

Quando falam em hora pequenina as pessoas estão a ser generosas e acho que é uma maneira de dar alguma força anímica à mãe. O período expulsivo foi árduo. Iria mentir se fosse dizer o contrário. Parir dói, estar grávida dói, as contrações doem. Mas o cérebro tem a capacidade de fazer "delete" dos momentos mais difíceis e de nos ajudar a situar no tempo as experiências mais positivas. Se assim não fosse a Humanidade estaria perdida e mais ninguém, com uma boa memória, voltaria a repetir a experiência da maternidade. Recordo-me de gritar (não contabilizei os decibéis), de espernear, de me contorcer com dores, de rezar para que aquele momento tivesse fim, de chorar. Mas - e repito - a equipa que me assistiu durante o parto (médicos, enfermeiros e auxiliares) foi incansável e paciente. Por tudo isto, tenho de louvar os profissionais de saúde deste país, porque tenho imenso respeito pelo trabalho que desempenham e, mesmo em momentos de maior desespero, procurei sempre tratá-los à altura e da forma como me trataram sempre: com muito respeito. Senti-me sempre respeitada e sei que todas as decisões que tomaram foi sempre para benefício da mãe (eu) e do bebé. Por isso, em momento algum iria refilar com estas pessoas que me AJUDARAM imenso. E não vou esquecer o que fizeram por mim, porque, acima de tudo respeitaram-me imenso e ajudaram-me em tudo. Quando digo tudo, não estou a exagerar. Foi mesmo tudo. A todas as equipas e todos os profissionais (infelizmente não memorizei os nomes de cada um, apenas as caras de alguns) agradeço imenso.


O meu bebé, depois de mais de uma hora a fazer força para que ele conseguisse nascer, acabou por vir a este mundo ao final da tarde do dia 1 de outubro. Ambos conseguimos que este nascimento acontecesse por parto natural. Um parto difícil, com muita dor, suor e lágrimas, mas que, quando vi o meu bebé no meu colo, imediatamente esqueci tudo o que tinha passado. Tudo. Porque a natureza de facto é mãe de todas as coisas e preparou as mulheres para que fossem fortes para aguentar todos os desafios da maternidade: a gravidez, o parto e o pós-parto.


O parto dói, o pós-parto continua a doer, porque a recuperação nem sempre é fácil, mas quando olhamos para o rosto do nosso bebé é impossível não pensar: "Como é possível sentir um amor assim, um amor que transborda, um amor que quase não cabe no nosso coração?" A maternidade é, na minha opinião desafiante. O corpo ainda está a recuperar, as emoções estão ao rubro, as hormonas deixam-nos KO e ora damos por nós a rir ou a chorar como se tudo fosse um drama da vida real, mas, no final, vemos que faríamos tudo novamente. Que emprestávos novamente o nosso corpo para alojar o nosso bebé, que é só nosso e que é a maior bênção que a vida nos deu. Eu estou apaixonada pelo meu bebé. Amo-o até ao infinito e mais além. Por isso, para mim, ser mãe é o "emprego" a tempo inteiro, não remunerado, mais gratificante do mundo. Porque não há dinheiro no mundo que pague cada momento com o nosso bebé. Agora, resta-nos aproveitar cada minuto a três, para nos conhecermos novamente, desta vez fora do útero materno.






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